domingo, 10 de março de 2013

Capítulo 45 – Aniversário



11/07/2017 Terça. 08:30h
Acordei, e em vez de encontrar o Rafa do meu lado, encontrei um bilhete, ou melhor, um talão do pingo doce que tinha uma mensagem no verso:

‘’Bom dia coisa feia.
Eu tive que sair, o trabalho não espera.
De qualquer maneira não podia ir embora sem antes te dizer uma coisa muito importante… Aqui vai:
Deixe-te panquecas com chantilly e morango no frigorífico!

Gostavas não é? Fica para mais logo! Tens pão em cima da mesa, leite, manteiga e fiambre no frigorífico.
Beijos
Eu… Tu sabes!‘’

Enfim. Aquele sorriso parvo do costume invadiu-me o rosto, porém depressa se desvaneceu quando olhei para o relógio. Vesti-me a correr e fiz a travessia criminosa para o meu quarto que estava trancado por dentro. Depois de vestir o pijama abri a porta e fui até á cozinha, onde já estavam os meus pais preparados para sair.

-Bom dia. – Disse lhes.
-Bom dia querida. – Respondeu o meu pai.
-Bom dia. Ainda bem que já acordaste, eu ia pedir-te um favor. – Disse a minha mãe á medida que se apressava para sair. - Precisava que fosses às compras hoje, a lista está ali em cima da bancada. Leva o teu irmão, para ver se ele não fica trancado no quarto a jogar.
-Está bem, vão lá.

Eles saíram e eu sentei-me na mesa a tomar o pequeno-almoço, depois de servir o Brown.
-Bom dia! – Apareceu o meu irmão na cozinha, já vestido e muito animado.
-Bom dia. – Respondi com um ar admirado. – Vais a algum lado?
-ya, vou andar de skate com o Felipe e a Dani.
-Ah sim? E com a autorização de quem?
-Aish! É só aqui na rua! Os pais deixam sempre!
-De certeza?
-Sim! Eu já não sou nenhuma criança.
-Claro que não. – Ri-me. – Olha que é mesmo só aqui na rua! Eu tenho de ir ás compras, por isso tens de ter juízo.
-Juízo é o meu nome do meio.
-Sei.

Assim que acabei de comer conduzi até ao supermercado que tava tal e qual como me lembrava. Fiz as compras e voltei para casa. Depois de assobiar inúmeras vezes para o meu querido irmão me ajudar a levar as compras para cima, continuou a brincar com o skate no fundo da rua como se tivesse ouvidos de pedra. Enfim, putos! Lá tive eu que carregar tudo sozinha.

15:00 – Depois de almoço.

O Ricardo entrou em casa e eu já estava a preparar o sermão.

-Ouve lá meu menino, mas isto é assim? Deixas o telemóvel em casa, não apareces para almoçar! Onde é que estiveste?
-Oh, eu queria vir, mas a mãe do Felipe insistiu para eu almoçar com eles, eu não consegui dizer que não. Desculpa.
-Desta vez passa. Mas para a próxima avisas, eu fiquei preocupada! 
-Eu sei desculpa, não volta a acontecer mana. Posso ir para o meu quarto?
-Vai lá.

Eu fui também para o meu, e comecei a procurar anúncios de casas para alugar nas redondezas, o que fez lembrar o Jake. Senti-me tão culpada que parei de procurar. Mais tarde ou mais cedo eu tinha de o enfrentar. Não podia continuar a ignorar as chamadas, a fingir que não se estava a passar nada.
Mas a verdade é que o fiz, passou-se um mês e eu continuei a fingir que não tinha um namorado, e a manter um romance mais que proibido que, apesar de me fazer feliz, me tornava numa pessoa que eu não podia nem queria ser. E assim se passou um mês, com entrevistas de trabalho, com muita praia e passeios, com uma gripe pelo meio que foi compensada com noites quentes (não me referindo ao tempo). 

10.08.2017 – Sábado.

Estava um calor insuportável, naqueles dias de pleno verão, e a Tixa e o Rui convidaram nos a todos para irmos passar um fim-de-semana à Ericeira, uma vez que a Madalena fazia 4 anos no Domingo. 

-Fogo, é sempre a mesma coisa! Vocês vão se divertir e eu vou ficar aqui à seca. Até o cão vai e eu não! – Refilava o Ricardo enquanto eu me preparava para ir ter com o Rafa.
-Não sejas assim! Vais para a próxima. - Dirigi-me à cozinha para comer qualquer coisa. – Que cheiro é este?
-Qual cheiro? – Perguntou o meu irmão que me tinha seguido até à cozinha.
-Este! – Peguei na taça da marmelada e quase que vomitei. – Que horror!  
-Tás doente ou quê? Não cheira a nada! Eu ainda há bocado comi.
-Arruma a taça no frigorífico então. Eu vou andando. Porta-te bem, ouviste?
-Que remédio.

Peguei na mochila, chamei o Brown e saí, dirigindo-me à porta do lado.

-Já estás pronta? – Perguntou o Rafa ao abrir a porta.
-Sim, e porque é que eu acho que tu ainda estavas a dormir?
-Não estavas cá tu para me manter acordado. – Agarrou na minha mochila e puxou-me para dentro, à medida que se aproximava para me beijar.
-Vamos… – Interrompi – Parar por aqui que a Di já deve estar à nossa espera.
-Eu tenho de ir tomar um duche rápido, queres vir? – Perguntou.
-Eu já tomei. Já fizeste o teu saco?
-Podias fazer me tu, tens mais jeito.
-Olha-me este! Grande lata ouve lá.
-É verdade princesa. - Agarrou-me por trás e beijou-me o pescoço. – Eu esqueço me sempre de alguma coisa.
-Pois, dá graxa dá. – Beijei-o uma última vez e empurrei-o para a casa de banho.
-As cenas de higiene estão aqui na casa de banho. – Gritou da banheira.
-A Mara vai? – Perguntei-lhe enquanto tirava as coisas do armário da casa de banho.
-Achas que sim? Eu quero estar contigo. E dormir contigo, (espreitou pela cortina) e fazer outras coisas contigo.

Beijei-lhe a cara cheia de espuma e saí da casa de banho. 
Ele acabou o duche enquanto eu lhe preparava o saco, e assim que nos despachamos, pegámos nos sacos, no Brown e saímos em direção à casa da Diana.

-A que horas é que combinaste com ela? – Perguntou-me já no carro.
-Às 10. Eu vou dar-lhe um toque para ela ir descendo.

-Bom dia malta! – Disse a Di ao entrar no carro.
-Bom dia! – Respondemos.
-Rafa! Que saudades! – Disse dando um abraço ao Brown, o que me fez rir.
-Eh eh. Estamos engraçadas hoje! – Refilou o Rafael.
-Sabes como é Rafinha, o meu amor por ti é incondicional.
-Junta-te à lista de espera. – Gozou.
-Tu és tão parvalhão! – Disse, rindo-me. – Di, fecha mais um bocadinho a janela do Brown para ele não pôr a cabeça de fora.

Continuámos a viagem com picardias e muita música e finalmente chegámos à Ericeira. Assim que estacionámos veio a Maddie a correr para o Portão. 

-Padinhooo!!! – Gritava à medida que o Rafa andava na sua direção.
-Quem é esta piolha feia? – Disse ao pegar a menina ao colo.
-Sou eu! – Gritou.
-És tu? – Mandou-a ao ar à medida que ela lançava fortes gargalhadas.
-Então pessoal, entrem. – Veio o Rui chamar-nos. – Rafa, ela acabou de tomar o pequeno-almoço vê lá se recebes um presentinho na camisola.
-O papá está com inveja, não está? – Disse o Rafa. – Faz-lhe o que o padrinho ensinou (deitou-lhe a língua de fora).
-O padrinho só te ensina coisas boas não haja duvida. – Riu-se.

Entrámos, e já estava a Tixa a preparar as coisas para o almoço, uma autêntica dona de casa! O Rafa foi para o jardim onde ficou a brincar com o Brown e a Maddie enquanto o Rui limpava a piscina. Eu e a Di dirigimo-nos à cozinha para ajudar a Tixa com o almoço.

-Então, o que vamos fazer? – Perguntou a Di.
-Bacalhau com natas. O Bacalhau já está cozido e desfiado, as batatas também já estão prontas, falta só fazer o molho bechámel e depois vai ao forno.
-Sim senhora! Estás a ficar melhor na cozinha, estou a ver. – Comentei.
-Teve de ser, senão o meu marido ainda me troca por uma cozinheira. – Rimo-nos. – Rita tira-me aí as natas, o leite e o sumo de limão que estão no frigorífico.

Assim que peguei no sumo de limão senti a barriga a andar às voltas e levei a mão à boca.
-Rita? O que é que foi? – Perguntou a Tixa.
-Nada, acho que o cheiro do limão me deixou meio enjoada. Isto deve ainda ser efeitos da gripe.
-Mas tu já não estavas melhor?
-Eu sei lá! Mas vá, esqueçam. Tens aí espinafres? – Perguntei.
-Sim, estão no fundo do frigorífico.
-Vou fazer um esparregado para acompanhar o bacalhau. A Marisa vem?
-Vem… E não vem sozinha!
-Hã? Como assim? - Perguntámos eu e a Di confusas.

Tocam à campainha.
-Por falar nela… Rui, abre o portão!
-Bom diaaa! – Disse a Marisa ao chegar à cozinha com… o Nando!
-Não acredito!!! – Gritou a Di.
–Finalmenteeee!!! Parabéns!! – Disse-lhes dando um forte abraço a cada um. – Fico tão feliz por vocês.
-Obrigada! – Disse a Marisa com um sorriso enorme e ainda de mão dada com o Nando que se encontrava igualmente sorridente. – Bom, mas vamos lá cozinhar, o que é que estão a fazer?
-Nando, podes ir para o jardim, estão lá os machos da casa. – Disse a Tixa, divertida.
-Sim senhora. – Respondeu o Nando esboçando um sorriso tímido.

Continuámos na nossa aventura culinária, e eu fui buscar o leite ao frigorífico para acrescentar ao esparregado. No momento em que estava a tirar o leite do frigorifico o Rafa passou pela cozinha, apalpou-me o rabo, mordeu-me a orelha e dirigiu-se para a sala. Quando me virei tinha as três a olhar para mim o que me deixou envergonhada.

-Oh…Meu…Deus! – Disse a Marisa com um sorriso espantado.
-É que vocês ainda não viram nada. – Interveio a Di. - Ele veio o caminho todo no carro com a mão em cima da perna da Rita.
-Oh meninas eu… - Tentei dizer alguma coisa mas não sabia o que dizer.

Quando elas me viram atrapalhada e um tanto quanto corada desmancharam-se a rir.

-Rita, não faz mal amor. Não precisas de te justificar! – Disse a Tixa. - Nós só não estávamos à espera.
-Sim, não precisas de ficar assim que nós já sabíamos. E nada me deixa mais feliz!! – Disse a Di.
-Mas nós vamos fazer isto da maneira correta. Eu estou a ganhar coragem para ir a Nova Iorque falar com o Jake, e vai falar com a Mara. Até lá iremos nos conter.
-Ui! Ele está num estado de contensão. Está mas é com tensão se é que me entendem. – Disse a Di provocando gargalhadas em todas.

O Rafa passou novamente pela cozinha para regressar ao jardim, e todas tentaram conter os risos.
-Porque é que estão a olhar assim para mim? – Perguntou confuso.
-Nada, não lhes ligues. – Disse-lhe. - Não queres ajudar a pôr a mesa?
-Está bem. Onde é que está a toalha?
-Está nessa gaveta atrás de ti – Respondeu a Tixa.

-Queres que eu ajude padinho? – Perguntou a Madalena ao entrar na cozinha.
-Isso mesmo princesa, só tu me compreendes. – Pegou na menina e deu-lhe um beijinho no pescoço. - Ajudas o padrinho a pôr a toalha na mesa?
-Sim! – Respondeu toda contente.
-Boa! Vamos lá então. – Pegou na sua mãozinha e saíram.
-Pst! Estás cá? – Chamou a Tixa ao ver que eu estava a olhar fixamente para eles.
-Hã? Sim! Eu estava só a…
-Eu sei. É lindo não é? – Olhei para ela e nem precisei de dizer nada.

Finalmente o almoço ficou pronto e seguimos para o alpendre, onde almoçámos e nós mantivemos a conversar após o almoço.

sábado, 25 de agosto de 2012

Capítulo 44 - Nunca vais ser a outra!



‘’Vá Rita!’’
- Disse para mim mesma. – ‘’Já chega de pensamentos! Vive cada momento que tudo se há-de resolver’’

E com isto levantei-me num salto, e saí do balneário. Tudo estava na mesma quando alcancei o chapéu azul, o Brown ainda deitado, o que me pareceu estranho, e os pombinhos ainda em lua-de-mel.

-O teu telemóvel tocou. – Disse-me o Rafa – Eu estive para atender, mas achei melhor não.

-Obrigada. – Disse sem olhar para ele. No visor do telemóvel deparei-me com 3 chamadas não atendidas… Do Jake. Voltei a colocá-lo na mala e dirigi-me para o mar, onde me concentrei nos mergulhos. O Brown ao ver-me no mar levantou-se, e manteve-se entretido a correr ora para o mar ora para a toalha, deixando a Mara furiosa, de cada vez que ele chegava perto das toalhas e a molhava. Fiquei lá ainda bastante tempo, quando comecei a ficar com fome. Saí da água, e dirigi-me ás toalhas onde já estava apenas o Ricardo.

-Estou cheia de fome, vamos comer qualquer coisa? – Perguntei-lhe. - O Rafa?

-Foi para o bar. Mas vamos, que eu também já comia.

Arrumámos as toalhas no saco, fechamos o chapéu e dirigimo-nos à esplanada do bar. Prendi a trela do Brown numa das cadeiras, para que não tivesse ideias de voltar para a praia.

-Eu vou lá dentro entregar o chapéu ao Rafael. – Disse ao meu irmão.

Entrei no bar que estava cheio, e esperei que o Rafa acabasse de atender uma mesa.

-Então? – Parou de andar quando me viu. – Eu fiz-te sinal a dizer que vinha embora, mas a menina sereia só dava atenção ao mar.

-Toma o chapéu. – Entreguei-lhe e preparava-me para sair.

-Hey, hey… Espera aí. – Disse, agarrando-me levemente no braço. – O que é que se passa?

-Nada. – Respondi-lhe.

-Nada não, tu estás estranha. O que é que foi?

-Não foi nada Rafael. Continua a trabalhar.

-Está bem, mas não penses que vais ficar assim. Falamos mais logo.

Fui ter com o meu irmão á esplanada e fizemos o nosso pedido à rapariga que trabalhava no bar com o Rafa.

-Já são quase sete horas, vamos embora? – Perguntei-lhe.

-Não posso ir com o Rafa mais logo?

-Não, o Rafa sai do bar ás tantas da noite, hoje vais comigo.

-Oh… - Cruzou os braços, aborrecido.

-Vai lá despedir-te dos teus amigos, depois vai ter comigo ao carro.

–Está bem.

Ele chegou ao carro depois de me deixar meia hora à seca e fomos para casa. Num instante se fez noite, e eu fiz o seu prato favorito para o jantar: esparguete à bolonhesa. Após o jantar os meus pais saíram, pelos vistos agora tinham por hábito dar uma caminhada no fresco da noite. O meu irmão foi para o seu quarto jogar no computador e eu fui para o meu, continuar a procurar emprego pela internet. Entretanto recebi um convite para uma videoconferência e acabei por ficar horas a falar com as meninas. Depois de todas falarem dos seus dias, contei-lhes o que se tinha passado com o Rafa, tal como já tinha feito com a Mariza. Elas reagiram da mesma forma, mostrando-se contentes, e ignorando o facto de eu ter cometido uma traição! Enfim… A verdade é que eu me sentia culpada e agora ao sentimento de culpa juntara-se os ciúmes que me corroíam cada vez que pensava no Rafael com a outra…

-Mas vá, conta lá os pormenores. – Disse a Diana entusiasmada.

-Diana! Deixa de ser perversa. – Disse a Tixa, rindo-se.

-Pormenores do quê? – Perguntei, apesar de saber a que pormenores ela se referia.

-Sexo! Daa. Afinal, vocês estiveram 6 anos sem se ver… E já não são dois adolescentes…

-
Tu és tão parva! - Ri-me. - O que é que queres que eu diga?

-Se foi bom, o que é que sentiste, se mudou, se melhorou com o tempo, sei lá!  

-Foi bom, claro… Foi maravilhoso. Digamos que o Rafa nunca teve problemas nessa área. – Respondi. – Mas não me apetece falar disso, só me faz sentir pior.

-Tens que ter calma, agora também não há muito a fazer. O que já está, já está. – Disse a Marisa.

-O que tu tens de fazer é pensares bem, nos teus sentimentos, naquilo que tu queres, e ignora tudo o resto. Porque se isto aconteceu, foi porque o Rafa ainda não saiu do teu coração. E se ainda não saiu como é que podes continuar com outra pessoa? Tens que perceber o que sentes, e não estejas a mentir a ti própria com medo de magoar alguém. – Disse a Tixa.

-Mas não sou só eu que estou comprometida… Vocês estão se a esquecer que ele está noivo. Eu não posso largar alguém que está comigo á dois anos e que sempre foi fantástico para mim, por outra pessoa que está prestes a casar-se.

-Eu não tenho qualquer dúvida de que se ele tiver que escolher, a sua escolha vais ser tu. – Disse a Di.

-Bem meninas, eu agora tenho de ir andando, amanha é dia de trabalho, e ainda por cima sou eu a levar a menina ao colégio. – Disse a Tixa.

-Sim, vamos todas, eu também tenho de ir levar o Brown á rua.

Despedimos-mos e de seguida fui ter com o Brown, que já estava á porta de casa desejoso de sair.

-Ricardo, vou lá abaixo. – Gritei.

-Está bem!

Desci e quando ia a sair do prédio cruzei-me com os meus pais que iam a entrar.

-Os senhores demoraram! Já caminharam tudo? – Perguntei.

-Já querida. A noite está boa para passear. – Respondeu a minha mãe.

-Só a tua mãe para me fazer andar isto tudo. Agora quero é a minha caminha.

-Podem deitar-se, eu ainda devo demorar que está-se bem na rua, em casa não se aguenta o calor e o Brown ainda não está muito habituado a estas temperaturas.

-Está bem filha, vê lá não fiques até muito tarde, a rua é calma mas nunca se sabe.

-Que exagerada mãe. Vá, vão lá.

Eles subiram e eu sentei-me no banco em frente ao prédio, enquanto o Brown corria pela relva. Estava uma linda noite de verão, e apesar de ser quase meia-noite, ainda se via muita gente na rua a passear, a andar de bicicleta, até os miúdos andavam a jogar á bola e á apanhada. Por acaso a coisa que eu mais gostava na minha rua era o facto de ser calma, sempre sem confusões, e não me lembro de alguma vez ter ouvido falar de assaltos ou qualquer tipo de marginalidade. Também era longe da estrada principal, por isso só passavam os carros das pessoas que por ali moravam. Estava eu ali a observar os miúdos, e a ter saudades dos tempos em que era igual a eles, quando alguém me tapou os olhos. Só não me assustei porque conhecia aquele toque e aquele cheiro a praia a milhas de distância.

-Rafa… - Disse calma e serena.

-O que é que me denunciou? – Perguntou, com um sorriso, sentando-se no banco ao meu lado.

-O facto de eu te conhecer há 23 anos.

-Pois! Esqueci-me desse detalhe. – Sorriu.

-Pois.

-Vais me dizer o que se passa, ou tenho de te arrancar?

-Não se passa nada.

-Vais ter que inventar outra, que essa não pega. Tu nem sequer olhas para mim.

-Não sou eu que tenho de olhar.

-Rita. – Com um leve toque no meu queixo, virou a minha cara, ficando frente a frente com a dele. – Não sejas parva, o que é que foi?

-Rafael eu não quero falar contigo, deixa-me estar sossegada.

-Não precisas de falar, podes dar-me beijinhos se preferires.

-Isso nunca mais vai acontecer. – Voltei a virar a cara.

-Como assim? O que é que queres dizer com isso? – Perguntou, desta vez sem o seu habitual sorriso.

-Quero dizer que tu nunca mais vais receber beijos meus. Tu tens uma noiva que te dá todos os beijos que precisares e outras coisas também.

-Já percebi. Tu estás assim por causa de hoje á tarde. Rita, o que é querias que eu fizesse? Que lhe contasse o que tinha acontecido? Que recusasse os beijos? Que acabasse tudo? Diz-me.

-Nada! Eu não queria que fizesses nada. Eu apenas caí na realidade. – Os meus nervos começavam a revelar-se, e as minhas mãos começavam a tremer.- Tu vais casar! Tu vais casar… Eu sou a outra no meio disto.

-Tu nunca foste nem nunca vais ser a outra. Ainda não percebeste isso? Por mais namoradas que eu tivesse, por mais coisas que acontecessem eras só tu.

-Era... Já não sou.

-Tu achas que eu planeei o que está a acontecer? Tu já fazias parte do meu passado, ou pelo menos era o que eu pensava, até te voltar a ver.

-E agora? – Perguntei.

-E agora o quê?

-O que é que vamos fazer?

-Panquecas.

-Hã? Rafa, estás doido?

-Não. Lembras-te daquelas panquecas que nós comíamos quando éramos pequenos, aquelas com chantilly e morango?

-Lembro.

-Eu adorava… E adorava tanto que aprendi a fazer. E ainda não te mostrei.

-Incrível a subtileza com que mudaste de assunto.

-E de que é que adianta estarmos a falar disto? Esta conversa não nos vai levar a lado nenhum. E porque não viver o momento?

-Referes-te a continuarmos a ser traidores sem vergonha?

-E porque é que tens de pensar assim? Pensa em nós, ignora os outros. Eu sinto a tua falta… - Aproximou-se devagar.

-Eu também sinto a tua falta. – Coloquei os braços á volta do seu pescoço e deixei-me levar num beijo apaixonado. - E desde quando é que sabes fazer panquecas? – Perguntei, rindo-me.

-Segredo de Estado. – Sorriu e voltou a beijar-me.

-Hmm… - Interrompi. – Eu tenho de ir.          

-Não… - Envolveu os dois braços na minha cintura, levantou-me uns centímetros do chão e começou a beijar-me o pescoço.

-Sim! – Ri-me.

-Sabes que… - Lançou um olhar provocador. – As panquecas são mesmo muito boas.

-Ah sim? Uau. – Ri-me.

-Estou a falar a sério.

-Sim, não duvido. Mas eu tenho os meus pais em casa, se eu não aparecer vão ficar preocupados.

-Podes sempre sair pela janela.

-Sim claro! Os tempos de tartaruga ninja já passaram à história.

-Não me digas que já não és capaz de saltar?

-Sou. Mas quem te disse que eu quero passar a noite contigo? – Disse, rindo-me.

-Autch…! – Colocou a mão sobre o seu coração, e deu uns passos atrás. – Sendo assim, eu vou para a minha casinha.

-Isso mesmo. – Disse, caminhando com ele para a entrada do prédio.

Subimos as escadas em silêncio, e quando chegamos ao 2º andar, dirigi-me para a minha porta.

-Ah isto agora é assim? Não me vais dar nem um beijinho? – Perguntou-me.

-Não. – Respondi-lhe com ar provocador, e entrei em casa sem olhar para trás.

Fui deixar o Brown na cozinha, e ele depressa se deitou na sua manta. De seguida fui ao quarto dos meus pais dizer que me ia deitar, e assim que cheguei ao quarto tranquei a porta por dentro. Abri a cama para parecer que lá tinha dormido, e abri a janela para saltar. A verdade é que eu queria sim passar a noite com ele, mais do que qualquer outra coisa. Abri a janela do seu quarto devagar, e entrei sem fazer barulho. Ouvi os seus passos a entrar no quarto e escondi-me atrás dos cortinados. Consegui perceber que ele se estava a despir. Mandou as roupas para o chão, e entrou na casa de banho, completamente nu, ouvindo-se de seguida o som do chuveiro. Eu despi os calções e o top, e vesti uma t-shirt dele, desliguei a luz, e permaneci ao lado da porta da casa de banho, esperando que ele saísse.

-Mãos ao ar. – Disse eu, numa voz calma, quando ele saiu da casa de banho.

Ainda de costas para mim, pôs as mãos no ar, deixando cair a toalha que segurava.

-Satisfeita? – Perguntou, com ar de gozo ao virar-se para mim, nu.

-Digamos que não era essa a minha intenção. – Ri-me. – Podes tapar isso?

-Podes passar-me os boxers? Estão na primeira gaveta da comoda atras de ti. A não ser claro, que precises de mim assim.

-Tu és tao parvo! – Atirei-lhe com os boxers violentamente.

-E tu és bruta. – Vestiu os boxers e aproximou-se de mim. – Mudaste de ideias em relação a passares a noite comigo?

-Não, vim só aqui passear.

-Hmm... - Pousou as mãos no meu rabo ao mesmo tempo que cheirava o meu cabelo. Comecei a beijá-lo e ele pegou-me pela cintura, pousou-me em cima da comoda, ficando no meio das minhas pernas. Continuamos entre beijos e caricias até que tocou o seu telemóvel.

-Rafa, o telemóvel está a tocar. – Disse, entre beijos.

-Eu sei. – Continuou, ignorando o toque

-Pode ser importante.

-Não é. – Voltou a pegar-me ao colo e desta vez mandou-me para a cama, ficando a olhar para mim enquanto eu me despia. Mais uma vez fizemos amor duma forma intensa e apaixonada, e de seguida continuamos deitados na cama, a conversar.
Com a cabeça no seu peito, ia passando as mãos pelo seu corpo moreno.

-Conta-me a historia das tuas tatuagens. – Pedi-lhe.

-E o que é que te faz pensar que existe uma história? – Sorriu.

-Oh, conta lá! Quantas tens ao todo?

-Sete.

-A sério? Eu pensava que eram menos. Mostra-me.

-Agora? Não me apetece.

-Mostra láá…!! – Pedi novamente.

-Eu tou cansado! Tu dás cabo de mim, sabias?

-Eu sei. – Beijei-o. – Mas mostra-me as tatuagens e eu prometo que te deixo dormir a seguir.  

-Tá beem! Melga. Esta foi a primeira. – Mostrou-me o desenho de uma prancha de surf que tinha na lateral do pé. – É pequena, foi mais para experimentar.

-Que fixe, ainda nem tinha visto. – Sentei-me na cama. - E depois?

-Depois foi esta. – Mostrou-me uma cruz pequena que tinha no peito, um pouco abaixo do ombro esquerdo. – Foi quando o meu pai morreu, eu sabia que a tatuagem não o traria de volta, mas foi a maneira que eu arranjei para o homenagear.

Permaneci calada, apenas lhe dei um beijo no rosto.

-Esta foi a terceira, e é a maior. – Apontou para a tatuagem do Bob Marley que tinha no antebraço.

-Essa foi a primeira que eu vi, quando me deste a toalha naquele dia em que nos encontrámos no balneário.

-No dia mais feliz da tua vida. – Gozou.

-Não, no dia que tu reencontraste a tua razão de viver.

-Uii! Estamos inspiradas. E depois o convencido é aqui o priminho.

-Aprendi com o melhor. – Sorri e voltei a deitar a cabeça no seu peito.

Fez-se um momento de silêncio e ele estava já de olhos fechados, cheio de sono.

-Rafa?

-Hmm? – Respondeu ainda de olhos fechados.

-Diz-me que isto é real.

-Não me digas que voltaste a ter medo de fantasmas. – Ainda de olhos fechados, esboçou um sorriso trocista.

-Oh, tu sabes o que eu quero dizer.

-Eu sei. – Abriu os olhos e inclinou-se sobre mim. – O que eu sinto por ti é real, sempre foi, e vai ser sempre.

Depois de ouvir aquelas palavras da sua boca só me apetecia ficar ali para sempre. Desejei que o tempo não passasse para que eu pudesse ficar ali, agarradinha a ele até ganhar raízes.

-Não estás a dizer isso para eu finalmente te deixar dormir pois não? – Ri-me.

-Ups...Como é que descobriste? – Sorriu e beijou-me de seguida.

-Tu…  és… tão anormal! - Disse-lhe entre beijos.

Escusado será dizer que ainda não foi desta que o deixei dormir…ihihih